O que eu andei para aqui chegar

Zélia Fernandes

2024-04-24


O 25 de abril marcou o início de um Portugal livre, com mudanças, que do lado do feminino e sobretudo do desporto no feminino foram ainda mais acentuadas. Num breve exercício de memória e recuando mais de três décadas desde que cheguei à Rádio Vizela as diferenças são abismais. Na altura sentia-me uma mulher num mundo de homens, muitas vezes olhada de lado e em algumas vezes recebendo simpáticas sugestões para que fosse para casa lavar a loiça, ouvindo afirmações de que isto não é para mulheres. Nunca levei nada a peito, pois lavar a loiça era algo que já fazia, para além do meu emprego e do contributo que dava na Rádio no setor desportivo, marcado na altura de forma vincada pelo futebol só para homens. 
Recordo-me que eram apenas o atletismo do FC Vizela e o minigolfe, que me permitiam escrever noticias de mulheres a praticar desporto em Vizela e em quase toda a região.
As coisas foram mudando, não tão depressa como se desejaria, pois nós mulheres sabemos que só se alcança a liberdade, com trabalho, verdade e com coragem. 
São esses os valores que, também na área do Desporto, têm de orientar-nos, para alcançarmos o objetivo final que é precisamente o da liberdade e da felicidade. 
Sinto por isso um grande regozijo ao comemorar os 50 anos sobre a Revolução dos Cravos, pelo trabalho que continuo a desenvolver, mas sobretudo por agora escrever muitas notícias sobre mulheres que vão triunfando no desporto em todas as modalidades. Sinto que há cada vez menos um desporto para homens, mas sim um desporto para todos, ao alcance de todos, para que seja parte fundamental para uma vida saudável e com liberdade para toda a gente. 

Com o 25 de abril podemos tomar decisões e seguir os caminhos que desejarmos, ainda que a coerência em minha opinião tenha de estar presente, com decisões tomadas com convicção e necessidade e não apenas porque sim. Vem isto a propósito da claque Força Azul, que anunciou que não acompanhará mais o Vizela, nos seus jogos até ao final da época. Liberdade é respeitar a decisão de cada um e eu respeito e até compreendo, no entanto, do que serve ter como slogan “até ao fim, até morrer”, ou mesmo “onde estiveres, eu estarei”, se deixamos o nosso apoio pelo meio. Já em muitas ocasiões e neste mesmo espaço destaquei como parte importante e fundamental em todos os momentos do FC Vizela, os seus adeptos, reconhecidos no país inteiro, pelo seu forte incentivo à equipa. Até agora sabia que muita gente falhou, em muitos momentos, desde dirigentes, treinadores e jogadores, mas os adeptos esses nunca tinham falhado e tinham sempre escolhido estar com a equipa, mesmo nos anos e anos a fio no Campeonato da 2ª Divisão B. 
Há ainda alguns que continuam até ao fim, dê por onde der, estiveram em Braga e apesar de tudo não saíram envergonhados no final do jogo.