
O Medo de ter Medo
Fátima Andrade
2020-05-07O Primeiro Ministro tomou a decisão: o terceiro período de estado de emergência passou a ser substituído pelo estado de calamidade, após algumas reticências que se impunha levar em conta para que a Constituição Portuguesa não fosse ferida.
A necessidade de se proceder a uma reabertura gradual do pequeno comércio e de algumas empresas bem como o inevitável regresso a uma normalidade possível no trabalho e na Escola, obrigou a um acerto das medidas respeitantes ao chamado estado de emergência para o atual estado de calamidade.
Não estando a pandemia controlada como quereríamos para um regresso pleno às atividades letivas e laborais, era imprescindível que se encontrasse uma solução que, embora com restrições, permitisse começar a abanar a economia que vive dias de agonia com o país de portas fechadas, há demasiado tempo.
Como é do conhecimento público, a solução de implementar o estado de calamidade tinha sido já aventada por uns tantos, que remetiam para a Constituição a inoperacionalidade da imposição de algumas das medidas restritivas consideradas no estado de emergência.
Alguns constitucionalistas fizeram-se ouvir, declarando inconstitucional a tomada de medidas no estado de calamidade pública, como seriam as restrições à circulação entre concelhos ; outros consideraram que o superior interesse das populações – a salvaguarda da saúde pública - justificaria a referida tomada dessas medidas.
Todos, e penso que poderei citar mesmo todos os Portugueses neste momento, já não têm dúvidas quanto à gravidade desta crise sanitária que obrigatoriamente nos empurrou para uma crise económica sem precedentes, estando cientes de que só poderemos ajudar a salvar a economia se nos salvarmos a nós próprios e que antes de tudo o mais, há que remeter todos os meios para o combate e prevenção da doença, seguindo-se as medidas apropriadas de verdadeiro apoio às pessoas, ao comércio, à indústria.
Maio teria de ser obrigatoriamente o mês da retoma; não o fazer seria adiar, não só a economia, mas também deixar, por tempo indeterminado, a educação das nossas crianças e jovens em suspenso, como que à espera que o vírus resolva comandar as nossas vidas por um período que ainda não conhecemos.
Meses e anos se passarão sem que possamos respirar de alívio, sem esse sentimento de medo que tolhe as nossas vidas.
Não devemos ter medo, ou melhor será melhor que tenhamos medo e o enfrentemos com a responsabilidade que tem caraterizado os Portugueses, pensando na sua saúde e na dos outros.
Como cidadã, continuarei a minha luta contra o vírus, na parte que me cabe, protegendo-me a mim e aos outros, continuando a respeitar o distanciamento físico, usando sempre máscara nos locais públicos, respeitando as orientações que sejam estabelecidas pelas autoridades competentes.
A pandemia obriga-nos a um modo de vida diferente daquela que tínhamos e não nos deixa alternativas.
Os hábitos que se enraizaram em nós são difíceis de esquecer, mas a vontade de regressar às nossas vidas, ensina-nos a ser pacientes e a saber esperar, adaptando-nos às circunstâncias que temos pela frente, onde cada um de nós encontrou a forma de ser e estar.
Neste contexto de crise, mais uma vez, os Professores Portugueses mostraram, na resposta dada aos seus alunos, num quadro de difícil execução, a sua capacidade de se adaptarem a todo e qualquer cenário criado pelas contingências presentes, encontrando as soluções possíveis e muito trabalhosas de ser professor em situações completamente novas e desafiadoras, como é o caso do ensino à distância.
Durante as férias da Páscoa, os Professores desdobraram-se em reuniões para que os alunos tivessem as suas avaliações, que lhes chegaram por e-mail ou correio, ao mesmo tempo que preparavam o novo período para os alunos do 1º ao 9º anos que, ora, têm um novo elemento na sua formação: o programa Ensino Em Casa - criado pelo Governo , em semelhança a uma longínqua Telescola, transmitido na RTP MEMóRIA.
Para os alunos dos 11º e 12ºanos, que regressarão à Escola a 18 de maio, o trabalho foi de continuidade. A preocupação na preparação das disciplinas de exame levou à criação de todo um conjunto de estratégias disponibilizadas nas plataformas digitais que permitiram um permanente contacto e uma interação eficiente entre professor e aluno.
Mesmo sem uma formação acentuadamente digital, os professores deitaram mãos à obra e tudo fizeram para que os seus alunos continuassem o estudo dos conteúdos programáticos à distância, nunca se furtando aos esforços que são necessários para levar a bom termo um processo de ensino-aprendizagem que chegue a todos os alunos, sabendo que nem todos estariam em condições de seguir aquele modelo e sem sequer conhecerem, no tempo devido, os conteúdos programáticos a transmitir pela RTP.
A Educação terá de ser sempre o principal elevador social, no qual têm de caber não apenas os alunos socialmente mais favorecidos, mas sobretudo aqueles, cuja condição social os impede de aceder, em igualdade de oportunidades, a todas as formas de educação. é um direito que lhes assiste consagrado na Constituição da República Portuguesa, mas que nem sempre veem cumprido.
Neste pressuposto, atendendo às soluções apresentadas pelo Governo para resolver alguns dos problemas que se puseram às escolas por força do surto epidemiológico, o ensino à distância revertido para um presente onde o digital assentou arraiais desde há longos anos, as respostas deixaram uma vez mais à vista de todos as fragilidades sociais impeditivas de aceder a essa forma de ensino por manifesta falta dos meios próprios. O certo é que será o chamado Ensino Em Casa aquele que terá maior sucesso junto dos alunos que não têm Internet ou o equipamento associado que lhes permita aceder ao chamado ensino à distância, através de plataformas digitais.
Se grande parte das crianças e jovens possui, neste momento, o seu computador, o seu tablet, telefone, impressora, banda larga, há uma franja acentuada de crianças e jovens, cerca de 50000 , em Portugal, que não possui qualquer equipamento tecnológico que os posicione em igualdade de circunstâncias, no acesso à formação online.
Várias Autarquias procederam à distribuição de alguns desses meios pelos alunos mais necessitados. No entanto, aqueles deverão ser entregues de novo às escolas, onde pertencem.
Para além do socorro às famílias , através de empréstimos e apoios de outra ordem , é agora necessário preparar o futuro e considerar a distribuição daqueles equipamentos a título definitivo a quem é mais desfavorecido. Os computadoes/tablets são agora o material escolar prioritário.
Às famílias portuguesas pouco dirá o facto de o seu país apresentar um excedente nas contas públicas se , num momento tão crítico como aquele que estamos a viver, não puderem proporcionar aos seus filhos o pão, a saúde e uma educação paradigmática com os tempos que vivemos por falta de meios , nomeadamente os tecnológicos.
Na chamada era digital e no contexto em que nos inserimos, é a oportunidade de as Autarquias investirem nesta área, cada vez mais imprescindível, de atribuírem, de forma definitiva, esses meios de trabalho para serem usados em casa e na Escola, possibilitando uma formação em continuidade a todos os alunos e em simultâneo com os outros colegas. Para além disso, urge definir-se um investimento sério na formação dos professores, atendendo a que ninguém sabe por quanto tempo o ensino à distância estará presente na vida das famílias , nas escolas e se alguma vez deixará de estar .
São realidades de uma nova era, também na Educação, que as sociedades deverão ter presente, obrigando à respetiva inserção nos Projetos Educativos Municipais, assim como nas Cartas Educativas de cada Concelho.
A Educação é um dos fatores mais decisivos no desenvolvimento das sociedades e um dos seus objetivos é fortalecer a cultura e os valores de uma democracia onde todos sejam considerados iguais nos seus direitos e deveres.
A adaptação aos tempos, à mudança, a novos critérios que obriguem à definição de orientações a todos os níveis e também aos níveis pedagógicos e didáticos, remetem para a recriação da nova Escola como paradigma da igualdade de oportunidades , independentemente da condição social. A não ser assim e, nomeadamente no que às crianças e jovens diz respeito e que vivem em contextos de infoexclusão , tendo na Escola o único acesso às Técnicas de Informação, assistir-se –á a um retrocesso no acesso à Educação.
Se considerarmos que o programa “Estudo em Casa” se tem revelado um sucesso de audiências, muito elogiado pelos pais que veem aqui uma oportunidade de acompanharem, atualizando ao lado dos filhos os seus conhecimentos, o investimento proposto será uma forma de colmatar algumas das desigualdades que continuam a subsistir e é notório o medo que todos têm de não apanhar o comboio a tempo.
é, pois, a altura certa de o Governo e as Autarquias traçarem um novo perfil de sociedade que obrigatoriamente sairá deste recomeço, onde tudo terá de ser pensado com todos e em nome de todos.
Para aqueles que, neste mês de maio, retomarão a sua atividade, os meus desejos de que o medo que sentimos cá no fundo, se vá desvanecendo com a nossa resiliência e a confiança de que este é só mais um período de medo que todos teremos de enfrentar com determinação, e …Com máscara!
Que as crianças e os jovens se revelem a luz de maio pela qual tanto ansiamos, na projeção de um futuro mais promissor, onde o medo ceda lugar à força e à esperança tão necessárias nestes dias. E combater o medo é também um dos objetivos que temos de conseguir.
Nota final: a 8 de maio próximo, a Real Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vizela perfará mais um ano de existência, ao serviço das populações com a entrega , o profissionalismo e o humanismo a que sempre nos habituaram. Mais do que as palavras, o nosso sentimento de gratidão para todos vós e o desejo sincero de uma existência longa a pensar no bem estar da comunidade.
Bem- hajam!





