Descentralização do Ensino Superior

António Gonçalves

2024-04-24

Desafios e Oportunidades para os Municípios


Demográfica e economicamente, o nosso país tem vindo a materializar um processo de litoralização, no que concerne à localização das principais dinâmicas de desenvolvimento económico e social, bem como a existência de oportunidades e consequente fixação da população, em particular da mais jovem e mais qualificada. Em sentido inverso, verificamos uma realidade humana, social e económica das regiões mais afastadas do litoral, nomeadamente nos municípios do interior do país. E para contrariar este cenário, sabemos que o vigor económico dos municípios está dependente da interação entre diferentes variáveis, algumas intrínsecas aos próprios municípios, como recursos naturais, infraestruturas municipais e de saúde, tecido empresarial, habilitação, qualificação da população, acessibilidades, meio ambiente, património e outras mais.
Neste cenário, assimétrico e socialmente injusto, de desenvolvimento do país, a faixa territorial mais interior tem assistido a uma perda permanente de economia, oportunidades, recursos, investimentos e população. É neste contexto que as instituições de ensino superior têm um papel de relevo no pressuposto de que, da sua ação, dependerá, também, a sustentabilidade desses territórios e alguma coesão social. Nesse contexto, estas instituições de ensino são agentes geradores de emprego altamente qualificado, possibilitando a atração de talento e funcionando como polo de atração de jovens de outras zonas de maior densidade populacional, moderando a perda de população. Por outro lado, e com a fixação dos seus recursos humanos, dinamizam diretamente a economia local e geram outros efeitos de importância fulcral para a transformação dos territórios de baixa densidade, através, por exemplo, da investigação desenvolvida, do talento e da inovação.
Com se sabe, o conhecimento atrai pessoas e gera investimento, fatores fundamentais para alterar o perfil competitivo dos municípios. A título de exemplo, refira-se o caso de Bragança e, posteriormente, de Mirandela, sendo que nada disto é uma coincidência. Há alguns anos atrás, o Instituto Politécnico de Bragança (IPB) traçou uma estratégia para atrair mais estudantes internacionais, sendo Cabo Verde e Brasil as suas primeiras apostas. Eram tempos de algumas dificuldades, com uma menor procura por parte dos estudantes nacionais e que afetavam, particularmente, as instituições do interior. O IPB apostou na divulgação da sua oferta e criou acordos de cooperação com instituições de vários países, num processo acelerado com a aprovação do estatuto do estudante internacional, em 2014. Estudos já efetuados comprovam o quanto é que os concelhos de Bragança e Mirandela beneficiaram, economicamente, com a presença daquela instituição de ensino nestes concelhos, com um importante contributo para a economia desta região. De facto, das empresas atualmente localizadas nesses concelhos, o IPB situa-se entre as três maiores empresas, em termos de volume de negócios e termos de número de pessoas ao seu serviço, é o maior empregador da região.
Outro exemplo, a outra escala, é o caso de Gandra, uma aldeia do concelho de Paredes, e que hoje é uma cidade multicultural, depois da fixação de uma unidade de ensino universitário, a CESPU, e que atualmente tem a maior percentagem de alunos estrangeiros do país, cerca de 33%, mais do dobro dos 12% da média nacional. O crescimento económico, o desenvolvimento urbano, o aumento dos serviços e a internacionalização, refletem o impacto significativo na freguesia e no próprio concelho, transformando-a de uma pequena aldeia em uma cidade vibrante.Atualmente, a cada vez mais ampla e qualidade de oferta de cursos nas instituições de ensino superior portuguesas, contribuirão certamente para uma maior procura por parte de alunos, inclusive estrangeiros. Neste sentido, a possibilidade de Vizela projetar-se na região e no país, a partir da criação de um polo de ensino superior, poderá ser uma realidade, partindo do seu potencial que poderá desenvolver, nomeadamente nas áreas de gastronomia, património, termalismo e turismo. Aproveitando, por exemplo, a futura Escola Superior de Hotelaria e Turismo do IPCA, em Guimarães, abre-se aqui uma possível oportunidade para trazer para Vizela um polo onde possam ser lecionados, de início, um ou dois cursos, numa dinâmica de necessidade e oportunidade por parte das entidades envolvidas, nomeadamente o município. Nesta equação, não poderá ser descartada a possibilidade da Universidade do Minho (tem como atual reitor um vizelense) num projeto similar futuro, naturalmente em outras áreas, e que Vizela poderá contribuir para potenciar alguns cursos. E se permitem a minha modesta sugestão, até já vejo na nossa cidade alguns edifícios com potencial para acolher esta oportunidade.
Estamos convictos que o poder local estará atento, pois um projeto destes representa um marco significativo para a afirmação do nosso município e como referência em apostas com uma visão de futuro, contribuindo para o desenvolvimento económico, da educação e da formação, criação de emprego, fixação de população jovem e qualificada, preservação do nosso património e promoção da nossa região. Que assim seja!