Retratos à La Minuta - XXXIX

Em memória de Domingos Pedrosa

2020-11-26


Há dias, um amigo passou por mim e perguntou-me: - Para quando um retrato de Salazar? - É hoje amigo. Ficou um bocado “escuro”, mas já era de esperar. Católico praticante que se saiba, só teve um amigo, o Cardeal Cerejeira, mais católico ainda, mas não por ser cardeal. Foi por o ter ouvido na televisão, com o indicador apontado, a dizer: - Portugal é um país pobre, e para bem do seu povo, sempre há-de ser. Assim, lembrar-se-á de Deus para lhe pedir ajuda. Enfim! O que fez Salazar entrar para o governo foi o vivido em Portugal desde a implantação da República, de 1910 até ao golpe militar de 1926. Neste 16 anos tivemos 8 presidentes da república, vinte e uma revoluções e vários assassinatos políticos. O custo de vida aumentou vinte e cinco vezes e o fosso entre ricos e pobres também. A igreja católica foi implacavelmente perseguida. Nas ruas de Lisboa explodiram 325 bombas. Desejoso de acabar com este clima de terror e violência instalado no país, Salazar, aceitou o convite do General Carmona para Ministro das Finanças logo que este foi eleito. - Sei muito bem o que quero e para onde vou. – afirmou na sua tomada de posse. E então criou o Estado novo, uma ditadura anti-liberal, anti-democrática, orientada segundo princípios fascistas, esvaziando o parlamento de poderes, ficando um partido único, a União Nacional. Os presidentes da república passaram a ter funções meramente cerimoniais já que o poder executivo era do presidente do conselho de ministros, que era ele. Em 1936 montou a PIDE, a feroz polícia política, para prender os opositores do regime, encarcerando-os em Caixas, Peniche e Tarrafal. A PIDE tinha “bufos” espalhados em todos os sectores da sociedade e tinha a sua sede na baixa lisboeta. Era tão brutal que os gritos dos desgraçados se ouviam na rua quando eram interrogados, espancados e torturados. Um, depois de libertado, tentou assassinar Salazar. Ia ele a caminho da missa, numa capela em Lisboa, e ao sair do carro, uma bomba explodiu a três metros. Salazar nada sofreu. Hitler felicitou Salazar por ter escapado e Mussolini enviou membros da sua guarda pretoriana para ajudar a PIDE na caça ao homem, que entretanto, tinha fugido para Inglaterra. A igreja, os mais altos clérigos, mandaram rezar missas de acções de graças por todo o país. Foi este atentado que, passados muitos anos, quando o ministro das obras públicas pediu a Salazar para dar o seu nome à ponte sobre o Tejo, o fez responder assim: - Se quiser dê, mas, ponha lá letras de tirar sem estragar nada porque um dia, ela vai mudar de nome. Hoje é Ponte 25 de abril. Em 1935, inspirado na juventude hitleriana criou a Mocidade Portuguesa. Era obrigatório pertencer-lhe dos sete aos catorze anos. Do uniforme fazia parte um cinto com um S de Salazar e a saudação era igual à saudação nazi, com um braço esticado. Uns meses depois surge a Legião Portuguesa para adultos. Em 1940 Salazar assina a Concordata com a Santa Sé já que prevalecia a separação do estado da igreja desde 1911, assinada por Afonso Costa. O Papa Pio não gostou e declarou: - É uma lei que despreza Deus, que enxovalha e insulta a majestade do Pontificado Romano, o episcopado, o clero e o povo lusitano e até os católicos todos do universo. Na guerra civil de Espanha, deflagrada em 1936, Salazar logo apoiou Franco enviando um destacamento de voluntários, “Os viriatos”, e armamento. Salazar manifestou assim a admiração que nutria por ditadores fascistas. Tinha a fotografia de Mussolini na secretária de trabalho e de Hitler disse que a Europa muito lhe devia por obrigar o comunismo a recuar as suas fronteiras. Salazar admirava tanto Hitler, que após o seu suicídio, mandou colocar as bandeiras portuguesas a meia haste, o único país do mundo que o fez. Em março de 1961, no norte de África, estala uma sangrenta revolta com o assassínio de colonos civis mulheres e crianças. A chacina merece de Salazar a resposta: - Para Angola, rapidamente e em força. Foi uma guerra com milhares de mortos, dos povos que acabaram por se tornar independentes e do exército português. Não há nenhum cemitério que não tenha soldados tombados no Ultramar, numa guerra que estropiou a nossa juventude durante 13 anos. Salazar para encorajar a nação enlutada proferiu uma frase que se tornou célebre: - Havemos de chorar os mortos se os vivos não o merecerem. O princípio do fim de Salazar começou em agosto de 1968. A queda de uma cadeira acabou por o afastar do governo, morrendo em junho de 1970, com 81 anos.