
NOVEMBRO, MÊS DA SAUDADE E DA GRATIDÃO
Pedro Marques
2023-11-16Novembro é o mês da saudade, onde a flor do crisântemo é a rainha nos asseios das sepulturas, num mês da terra em repouso depois de um ano agrícola de canseiras, das lavras às colheitas. A simbologia da flor do crisântemo vai da perfeição à eternidade; da felicidade, à autenticidade; da tranquilidade, à homenagem e saudade por quem já faleceu. Além de tudo isto, o crisântemo é ainda a flor da humildade e da simplicidade.
É também em Novembro o “pousio” da terra, que “adormece” até ao solstício de inverno. E por isso as podas acontecem neste período de “dormição”, no qual as plantas se podem mudar com raiz de um sítio para outro sem estranharem. Como criança que a mãe leva ao colo e a dormir de um local também para outro sem acordar. Nestes tempos da terra em dormição, nas podas, as plantas “feridas” não “choram” ao serem podadas. Do que são exemplo as ramadas e agora os bardos das vinhas. No entanto, a partir de Janeiro e sobretudo nas videiras, os ramos decepados já “choram”, e bem, até à cicatrização das feridas dessas podas.
E é por isso que, em Novembro, neste pousio da terra e até do Espírito, física e mental e psiquicamente, a pessoa se predispõe mais para a melancolia, para uma saudade indefinida, para a interiorização. E é quando acontece, com mais intensidade, a lembrança dos nossos mortos. Num dia santo que, de manhã é de festa e os sinos bamboleiam de alegria em homenagem a todos os santos sem altar; mas que, de tarde já choram na romagem ao cemitério, embora o dia dos “fiéis defuntos” seja o dia seguinte: dois de Novembro. Quanto então era assim, manhã muito cedo e longe estava ainda a luz do dia, era a romagem ao cemitério dos “fiéis defuntos” e se cobriam, com pétalas de crisântemo branco, as campas rasas, de terra nua e apenas com uma cruz à cabeceira. Então e por vezes a brancura da geada confundia-se com as pétalas brancas das flores.
Além de recordarmos os nossos familiares defuntos (fora de acção), neste mês em curso, hoje, lembramos, de modo especial e mais próximo e sem esquecer ninguém, pessoas que nos foram queridas e por quem nutrimos amizade e consideração. De modo mais intenso, e por isso ter acontecido nestes últimos dias, lembramos e homenageamos Baltasar Oliveira; Manuel da Silva Magalhães e esposa Emilinha “Nicolaua” (Marques também como nós…) e Ilda Ribeiro. Com efeito a todos estes nos uniam laços de amizade e muita consideração. Do âmbito da literatura (poesia), às conversas de convívios que até aconteciam com alguma regularidade, enquanto foram possíveis.
Na literatura, lembramos e homenageamos a poetisa Ilda Ribeiro, de quem possuímos livros e até fomos à apresentação de um na Biblioteca Raúl Brandão em Guimarães. Além disso, convivêmos com esta ilustre e então muito dinâmica senhora, que até deixou “Obra” em Vizela. Na verdade, a ela se deveu a fundação do núcleo da Cruz Vermelha local. No âmbito dos convívios e nos quais recolhemos muitas memórias que temos em arquivo e até para nós cantou quadras ao S. Bentinho das Peras e quase todos os domingos a levava connosco à missa a Tagilde quando na sua igreja colaborámos no grupo coral e ao órgão.
Recordamos, por fim, o que foi nosso amigo – Baltasar Oliveira - e connosco até colaborou, por exemplo, na feitura do nosso livro “Na Rota dos Moinhos” onde há episódios e memórias da “sua” Quinta do Ribeiro. Em toda a sua vida, este nosso amigo, ele próprio, foi um poema escrito pela terra que ele tão persistente, carinhosa e teimosamente cultivou. Mas não só um poema da terra escrito com o suor do seu rosto: ele mesmo escreveu textos que partilhava connosco para saber da nossa opinião. Textos que eram verdadeiros poemas da sua devoção à terra como a de outros devotos aos seus santos. Homem humilde, mas culto e socialmente muito bem conceituado.
Aos agora evocados e a exemplo de todos quantos nos antecederam, fica a nossa prece de que “a terra lhes seja leve”, na expressão do Povo que tanto reverenciamos e admiramos, pelo esforço do seu abnegado trabalho que nenhum holofote ilumina, mas sem o qual nenhuma nação sobrevive, pois, toda a riqueza criada vem do esforço do tão ignorado trabalho do campo.
Ámen.
Com o abraço amigo de sempre.