Em nome da Mulher

Fátima Andrade

2019-03-14


Passado que é o 8 de março, o estabelecido dia Internacional da Mulher, celebrado, habitualmente, com muita festa, almoços, jantares e os já habituais molhos de flores distribuídos em gestos quase obrigatórios, na ânsia de apagar más memórias, incongruências sociais, seja no feminino ou no masculino, há que repensar esta data como um todo de conceitos generalizados na ideia da necessidade da existência de um dia consagrado à Mulher.
O Dia Internacional da Mulher, a lembrar a coragem de um bom punhado de trabalhadoras reivindicando os seus direitos laborais, num universo longínquo, onde ao Homem, pelo facto da sua masculinidade, era-lhe reconhecido o direito a ganhar mais do que a Mulher, fazendo exatamente o mesmo trabalho, tem-se  perpetuado no tempo, mas vindo a perder a sua verdadeira simbologia, pelo simples facto de que a realidade mudou, as mentalidades evoluíram e as mulheres já não aceitam, de bom grado ser tra-tadas como seres inferiores, quando pela sua re-siliência, pelo seu empenho, pela sua capacidade de amar conseguem suplantar todos os obstáculos , apresentando as melhores qualificações no mundo do trabalho parecendo que, se bem que o reconheçam, as entidades empregadoras, na sua maioria, parecem não querer entender aquilo que é evidente: com o seu trabalho, a Mulher faz, realmente girar a economia do país, trabalha para criar riqueza, para melhorar as condições do nosso e da grande maioria dos países ditos desenvolvidos.
Aquela figura frágil a necessitar de proteção constante, deixou de existir. O perfil da mulher do século XXI é o de uma mulher independente, criativa, empreendedora, dona de casa, mãe, esposa, ou não – esse desiderato, outrora colado à Mulher, deu lugar a uma liberdade de ação, permitindo que aquela escolha o seu percurso pessoal e profissional.
Se bem que toda a Sociedade reconheça os avanços que se têm verificado na aceitação da Mulher como cidadã, apta a exercer a sua cidadania plena, em todos os quadrantes da sua vida, acabamos por reconhecer, de forma brutal que esses avanços só se verificam num mundo que todas nós queremos construir: um mundo onde a igualdade de género é uma realidade incontestável, onde a Mulher e o Homem caminham lado a lado.
É, de facto, por conviverem lado a lado, nesse tal mundo cheio de contradições que hoje sabemos, que desde o início do ano 13 mulheres foram barbaramente assassinadas pelos companheiros e que em 15  anos, 503 mulheres não mais verão o sorriso dos seus filhos, não mais receberão o carinho dos seus familiares e amigos, porque nasceram mulheres, despojadas dos seus direitos, da sua condição de ser mulher, negando-se-lhes a sua plena cidadania.
A questão da violência doméstica tomou proporções tão alarmantes na nossa sociedade que ninguém poderá ficar indiferente e deixar de dar o seu contributo, no sentido de se encontrarem medidas firmes que consigam acabar com este vergonhoso quadro de terror que nos chega, todos os dias, através dos Média. É precisamente a estes que devemos o tomar conhecimento de como as Mulheres têm vindo a ser tratadas e usadas, mesmo por alguns daqueles que as deveriam proteger e que, ao invés, se enredam em preconceitos sexistas e misóginos, na ânsia de se livrarem das suas frustrações.
Defender os agressores envolvidos na violência doméstica, os assassinos de mulheres, não está implícito na letra da lei. Nem poderia estar. Nenhuma lei pode conferir a hipótese de se permitir os maus tratos e a morte.
Chega de tanta incompetência e desumanidade. Há um longo caminho a percorrer. E ele tem de ser percorrido: A começar pela prevenção – na Escola, em casa, na Sociedade, em geral.
O crime de violência doméstica é crime público. Quer isto dizer que não só a vítima o deve denunciar, como um qualquer de nós, que dele tenha conhecimento, não o pode ignorar. Denunciar um agressor é sinónimo de salvar supostas vidas humanas. E quem quererá viver com esse anátema dentro de si?
Se as leis existentes já não cumprem o seu papel, então há que legislar, de novo, uma e outra vez, até que as mulheres possam sair à rua sem medos e exercendo sem complexos os seus direitos de cidadãs livres, neste país que queremos seja reconhecido como um país onde os direitos humanos são respeitados. É disso que se trata. Os direitos das mulheres são direitos humanos.
E, então, sim, reflitamos se teremos necessidade de reservar um dia para a MULHER. Não creio.

E esta é que se impõe como a real questão.