DAS ALMINHAS NO CONCELHO DE VIZELA OS PATRONOS DAS INVOCAÇÕES
Pedro Marques
2024-08-01Muitos dos nichos das “Alminhas” são sob a invocação do arcanjo S. Miguel, vestido de soldado ou de guerreiro, de lança na mão e com o dragão (Satanás) subjugado a seus pés, depois de dominado por si e pela legião de anjos que o socorreram na defesa de Deus contra Quem ele se rebelou.
Noutros nichos, é a imagem da Senhora do Carmo, sobre uma nuvem saída da terra, porque assim ela surgiu na aparição em que aconselhou o escapulário.
Nas “Alminhas“de S.to Adrião Adrião, com as obras de requalificação da igreja e adro, houve modificações. Não só no nicho das “Alminhas” como na mudança de sítio do cruzeiro. Quanto ao nicho das “Alminhas” acoplado à parede sul da torre, ele foi deslocado para junto da entrada do salão paroquial a poente. Mas não apenas isso: de dentro do nicho, foi retirado o painel da invocação das Almas à Senhora de Fátima, o qual foi substituído por um retábulo em folha metálica, de cor castanha, ou oxidado pela ferrugem; folha essa toda picotada e onde nos minúsculos orifícios em contra-luz se desenha a imagem da Senhora de Fátima e dos pastorinhos.
Em S. Paio, há um nicho sob a invocação da Senhora do Sameiro. Em Vilar e Tabuadelo, o motivo da invocação é a “elevação da hóstia e do cálice” pelo sacerdote a celebrar missa. De costas para o povo, em Tabuadelo; já voltado para a assembleia, em Vilar. Ainda em Tabuadelo, há um nicho de “Alminhas” sob a invocação de S. José mais a Senhora do Carmo.
Noutras ainda, além do S.to António como em Alfaxim, e em Infias no Largo do Cruzeiro a poente, as “Alminhas” são sob a invocação do Senhor Crucificado. Nas de Chambers, a invocação assim o é também. Nas da entrada para o adro da igreja de S. João, é também sob o mesmo orago.
Na alameda de Vilarinho, abaixo da Senhora das Dores, havia um nicho às Almas sob o rogo do Menino Jesus de Praga. E o mesmo ainda, nas “Alminhas” de Rebordelo ou rua de Prados, também sob a invocação de Jesus Crucificado. Estas, numa pintura em chapa de folha de flandres. Mas há mais.
Entre o passado e o presente das “Alminhas” no concelho de Vizela e periferia, poderá concluir-se que a devoção às almas do Purgatório, através dos nichos, é uma devoção dinâmica; isto é, a colocação de nichos a elas dedicados não cristalizou naqueles em que é possível ver-se, nas mais antigas, a data do ano que se situa no terceiro quartel do séc. XIX. Para trás deste quartel, noutras localidades já deveriam existir nichos de “Alminhas”. Por exemplo, as “Alminhas” do Senhor do Padrão e do Carmo, é bem provável que venham já de finais do séc. XVIII. Para trás do último quartel do séc. XIX, em Vizela (S. Miguel), temos as “Alminhas da Fonte”.
No concelho de Vizela, e já erigidos no séc. XX, há vários nichos e painéis. Alguns devidamente identificados pela data gravada em baixo-relevo. E todos estes nichos a partir de 1950 – Lamarão, Cruz Caída, Veigas, Santiago, Trancosa, Souto, Lagoas, Vilar, adro da igreja de S. João. E na vizinha freguesia de Revinhade, uns cem metros antes da rotunda para o desvio da autoestrada, há um nicho sob a invocação do S. Bento. Desde 2014.
Na música, pelas almas dos defuntos, ficaram célebres os “requiem” do Mozart e do nosso Domingos Bomtempo; de Verdi e Berlioz; de Fauré e Perosi. Para não se referirem outros mais.
Na cultura popular religiosa, havia a oração familiar pelas almas, à noite, no fim da ceia e em complemento da reza do terço. Ao tempo, à volta da lareira. Só depois de invocadas as almas de todos os familiares e amigos e de almas “perdidas”, a “vaguear” pelo mundo, é que se ia para a cama.
Havia, também, a tradição processional da “encomendação das almas” ou “amenta das almas”: procissão nocturna em cada sexta-feira da quaresma. Com um ritual próprio, quase supersticioso, às invocações públicas em voz alta, com o bater do bordão na porta da igreja a invocar as almas até à subida ao monte mais próximo e regresso antes da meia-noite. Hoje, este costume está recolhido na etnografia popular religiosa.
Outro pormenor a considerar nas “Alminhas” é o sentido e teor das súplicas: de um simples “rogai por nós” e “ Oh, vós que ides passando, lembrai-vos de nós que estamos penando”, a súplica vai para as orações-poemas de uma belíssima singeleza de devoção. As “Alminhas” de Santiago, de S. Simão e de S. Faustino, de Idanha, além de outras, são disso exemplo.
E nas “Alminhas” de S. Simão, há dois diabinhos, no meio das chamas do purgatório, com uma forquilha a tentar roubar almas! Diabinhos endiabrados!
Com o abraço amigo de sempre.